Às vezes em caixas. Outras, em gavetas. Outras tantas, no lixo. Falo de coisas diversas. Refiro-me aos brinquedos, que foram saindo de cena, um por um. Esconderam-se na caixa de um tempo que esvaiu-se à medida que se abriu uma lata de zinco contendo esta resina densa de maturidade. Falo de pessoas que já foram. Pessoas de cujas partidas lembro-me com pesar. Pessoas cujas partidas causaram-me alívio. Pessoas que demoraram a partir. Permanência indevida. Falo ainda de sonhos, ideias, planos e esperanças. Que longa existência de eterna reciclagem. Não sei o que é saudade. Tudo que foi, na maioria das vezes, foi tarde. O que fica são marcas, registros. E eu. Fico. Permaneço. Marcado. Alterado em pequenas áreas e esferas, mas, em essência, o mesmo projeto.
Às vezes abro uma das caixas. Outras, verifico se algumas gavetas estão devidamente trancadas. Geralmente as caixas são o destino final dos capítulos que volta e meia releio. Dos brinquedos nos quais, vira e mexe, quero mexer novamente. Suas tampas facilitam o acesso. Alegro-me quando, ao abri-las, sou tomado de surpresa por uma peça do lego que salta e aterrisa no chão. Em uma das caixas, nunca me lembro qual exatamente, ficam as fotos, os filmes e restos de pele morta. Esses guardo para lembrar-me, no futuro não tão distante, do que se foi e deixou esses sulcos que se aprofundam lenta e sorrateiramente. São esses restos, nada ou ninguém mais, que me lembrarão da juventude que por ora ocupo-me de sugar até a última gota.
Já fui parar em caixas e gavetas de outrem. Houve momentos em que fiz questão de me enfiar nelas. Fui também enfiado. Nada mais natural. Sei que não escaparei da última caixa, sequer da grande gaveta. Só não quero e nem preciso ver nenhuma das duas. Deixarei que cuidem disso quando eu os tiver deixado sem a promessa de um futuro retorno. Num futuro distante, assim espero.
Um comentário:
aff! ando numa fase em que eu estou louca para mandar muita gente para a gaveta!
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